Depois de avançar a 1,15% em dezembro por conta dos preços da carne, a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), desacelerou para 0,21% em janeiro, conforme divulgou nesta sexta-feira (7) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É o menor resultado registrado no mês desde o início do Plano Real, em julho de 1994. No acumulado dos últimos 12 meses, o indicador registrou 4,19%.
O valor de janeiro ficou abaixo do esperado pelo mercado. A expectativa do Top 5 do Boletim Focus, por exemplo, formado pelo grupo dos economistas que mais acertam, era de um avanço de 0,32%, igual ao verificado em janeiro do ano passado.
“Foi um resultado surpreendente. Prevíamos uma taxa de 0,4%, o dobro do que veio. Erramos na magnitude dos movimentos. O IBGE registrou para carne bovina, por exemplo, recuo de 4% e a gente esperava queda um pouco mais tímida, em torno de metade disso”, diz André Braz, especialista em inflação do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Ibre/FGV).
O recuo no preço das carnes foi o grande responsável pela desaceleração geral dos preços, segundo o gerente de Índice de Preços do IBGE, Pedro Kislanov. Esse movimento pode ser visto na variação do grupo Alimentação e Bebidas, que foi de 3,38% em dezembro para 0,39% em janeiro.
Após a alta de 18,06% no mês anterior, as carnes apresentaram queda de 4,03% no IPCA de janeiro, contribuindo com o maior impacto negativo no índice do mês (-0,11 p.p.), segundo ele.
“Tivemos uma alta muito grande no preço das carnes, nos últimos meses do ano passado, devido às exportações para a China e alta do dólar que restringiram a oferta no mercado interno. Agora, percebemos um recuo natural dos preços, na medida em que a produção vai se restabelecendo para atender ao mercado interno”, disse Kislanov em nota.
Para Braz, do Ibre, a variação dos preços no início do ano antecipa parte da devolução pelas altas registradas no final de 2019. “Lembrando que, apesar de ser um bom número, ainda não neutraliza a sensação do consumidor. Isso porque os aumentos acumulados ainda superam muito essa pequena devolução registrada em janeiro”, diz.
Esse efeito de devolução deve continuar. “Não se limita a esse mês. Em fevereiro, queda deve ser mais acentuada, porque a carne pode continuar caindo”, completa Braz.
IPCA – Brasil – Variação 12 meses
O grupo Habitação teve a maior alta entre os nove grupos de produtos e serviços pesquisados (0,55%), assim como o maior impacto na inflação mensal (0,08 ponto percentual p.p.). Segundo o IBGE, isso aconteceu por causa dos preços de condomínio (1,39%) e aluguel residencial (0,61%).
Outros cinco grupos também apresentaram alta, com destaque para os Transportes, que com uma revisão do IBGE se tornaram o grupo com maior peso na cesta de e Transportes (veja mais na tabela abaixo).
O resultado dos Transportes (0,32%) foi puxado pela gasolina (0,89%) e o etanol (2,59%). O peso dos impostos nos preço dos combustíveis foi o estopim de uma divergência pública, nesta semana, entre o presidente Jair Bolsonaro e os governadores.
Os preços dos ônibus urbanos variaram 0,78%, devido aos reajustes nas tarifas em várias regiões. Já o maior impacto negativo (-0,05 p.p.) veio das passagens aéreas (-6,75%), que haviam apresentado alta de 15,62% no índice de dezembro.
No lado das quedas, a contribuição negativa mais intensa (-0,04 p.p.) veio de Saúde e cuidados pessoais (-0,32%). Os demais grupos ficaram entre a queda de 0,48% em Vestuário e a alta de 0,35% em Despesas pessoais, destaca o IBGE.
Nova estrutura
Nos cálculos da inflação de janeiro, o IBGE usou pela primeira vez a estrutura atualizada pela edição 2017/2018 da nova Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que acompanha as mudanças nos hábitos de consumo da população. Com a atualização, 56 novos produtos e serviços passam a fazer parte do cálculo, incluindo aplicativos de transporte e serviços de streaming, como Uber e Spotify.
Entraram também na conta despesas relacionadas à vida saudável e estética, tratamento e higiene de animais domésticos e até o consumo de macarrão instantâneo. Outros itens, porém, perderam espaço ou foram excluídos, como aparelhos de DVD, assinatura de jornais e máquinas fotográficas.
Kislanov observa que nenhum dos novos itens da cesta impactaram o indicador em janeiro, mas cita algumas variações: o transporte por aplicativo, cujos preços foram coletados pelo robô criado pelo IBGE, recuou 0,54%, com a maior queda em São Paulo (-2,89%) e maior alta em Goiânia (1,99%).
Já os serviços de streaming não variaram. Higiene de animais domésticos registrou alta de 0,19%, cabeleireiro e barbeiro de 0,20% e sobrancelha, 0,26%.
Para 2020, a projeção dos especialistas de instituições financeiras ouvidos pelo último Boletim Focus é que a inflação fique em 3,40%. A meta é de 4%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo.
Exame
Foto Cris Faga/NurPhoto/Getty Images